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A beleza da matemática

Um desafio global: formar professores capazes de passar a paixão pelos números aos alunos
por José Eduardo Agualusa

“O binômio de Newton é tão belo como a Vênus de Milo. / O que há é pouca gente para dar por isso.” — Escreveu Álvaro de Campos, através de Fernando Pessoa, num pequeno poema que sei de cor desde a adolescência e que sempre me sobressaltou. Quando tentam explicar a paixão que os move, quase todos os grandes matemáticos acabam insistindo em duas palavras: verdade e beleza. Elegância é outro adjetivo muito comum, e um tanto surpreendente no idioma despojado e preciso dos matemáticos.

“O verdadeiro espírito de alegria e exaltação — no sentido de ser mais do que o Homem — que é a pedra de toque da mais alta excelência encontra-se na matemática, tanto quanto na poesia.” A afirmação é do filósofo britânico Bertrand Russel. Estudos recentes de neurociência vieram confirmar a afirmação de Russel: a resolução de um qualquer problema matemático, através de uma fórmula elegante, ativa as mesmas áreas cerebrais que a leitura de um bom poema ou a audição de um samba de Cartola ou de Paulinho da Viola.

Em “Uma história da simetria na matemática” (Zahar), Ian Stewart vai um pouco mais longe. Segundo ele, “em física, a beleza não garante automaticamente a verdade, mas ajuda. Na matemática, a beleza deve ser verdade — porque as coisas falsas são sempre feias”.

Desta forma, procurando a beleza, deveríamos chegar inevitavelmente à verdade. Ao menos na matemática. Fora da matemática nem sempre é assim, o que, sinceramente, acho uma pena. Imaginem um mundo onde as pessoas fossem tanto mais bonitas quanto mais honestas, simples e sinceras. Tudo seria mais fácil.

Fui um aluno medíocre em matemática, pelo menos até chegar à universidade. Em Agronomia e Engenharia Florestal encontrei, pela primeira vez, bons professores, pelo que melhorei ligeiramente as minhas notas. Recordo que acompanhei algumas aulas de lógica matemática com um sentimento de surpresa e maravilhamento muito semelhante àquele com que li os primeiros livros de Jorge Luis Borges (por um acaso feliz, descobri ambos na mesma altura).

Nos últimos anos voltei a interessar-me por matemática, como resultado de uma paixão mais geral sobre linguagem e comunicação. O grande livro do universo, como lembrou Galileu, lá longe, no século XVII, está aberto diante dos nossos olhos e foi escrito no idioma da matemática. Se um dia a humanidade entrar em contato com alguma civilização extra-terrestre, a linguagem utilizada será, sem dúvida, a matemática. Carl Sagan sugere isso mesmo em “Contato”, livro que serviu de base para o filme com o mesmo nome, dirigido por Robert Zemeckis. No livro (e no filme) a protagonista, Ellie, convence-se que há uma civilização extraterrestre avançada tentando contatar a humanidade, ao capturar uma emissão vinda do espaço com uma sequência de números primos. Mais tarde, essa civilização avançada envia uma série de fórmulas matemáticas, as quais permitem a construção de uma máquina capaz de transportar Ellie até esse mundo remoto.

A suposição de Sagan faz todo o sentido. Imaginemos que um extraterrestre desembarque no Rio de Janeiro. É altamente improvável que queira tomar uma cervejinha conosco para conversar sobre as propostas de Michel Temer e Marcelo Crivella ou o resultado das eleições americanas, ainda que a inesperada vitória de Donald Trump possa preocupar até mesmo os marcianos. É improvável também que se interesse por futebol, por teologia ou por pornografia. Quero acreditar que esse visitante extraterrestre será sensível à música (pelo menos a alguma música, certamente não ao country), na medida em que esta tem forte parentesco com a matemática. A música é quase uma expressão sonora da matemática. Vários compositores vêm usando no seu trabalho conceitos matemáticos complexos, como, por exemplo, a famosa Sequência de Fibonacci, presente em muitas estruturas e fenômenos naturais.

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