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Déclaration



A influência que a cultura americana exerce sobre nós, em parte se deve ao fato de as escolas terem, praticamente, abandonado o ensino de outras línguas, como o francês. A ênfase e a importância dadas por aqui ao inglês, e mais recentemente ao espanhol, são responsáveis pela ignorância dos jovens, da diversidade da cultura européia, especialmente a francesa.


Tempos atrás, me surpreendi quando um dos meus filhos, que fala fluentemente o inglês, não foi sequer capaz de identificar o idioma que ele me viu conversar com um estrangeiro, na Lapa, mostrando o quão distante estamos ficando desta riquíssima fonte de conhecimento, arte, costumes e comportamentos.


Mas, não era sobre isso que eu queria falar. Ou melhor, tem a ver: dias atrás reencontrei a letra de uma música do cantor e compositor francês, Georges Moustaki, um dos mais produtivos e criativos da França, o que me trouxe lembranças de muito tempo atrás - meados dos anos 70 - quando ele gravou músicas do maestro Tom Jobim, Chico Buarque, Toquinho e Vinícius, com grande repercussão por aqui, e que tive o prazer de ouvir em vinil, indicado, justamente pela minha professora de francês no Andrews. Muito legal!


A música que mencionei chama-se Déclaration (Declaração) e me atrevo a traduzir abaixo para vocês:


Eu declaro o estado de felicidade permanente

E o direito de cada um a todos os privilégios.

Eu digo que o sofrimento é algo sacrílego

Quando há para todos as rosas e pão branco.


Eu questiono a legitimidade das guerras,

A Justiça que mata e a morte que pune

As consciências que dormem no fundo de seus leitos,

A Civilização nos braços de mercenários.


Eu vejo morrer este século envelhecido.

Um mundo diferente renascerá das suas cinzas

Mas não basta simplesmente esperar:

Eu esperei muito tempo. Eu quero isso agora.


Que minha mulher esteja linda a qualquer hora do dia

Sem ter que se esconder sob a maquiagem

E que deixar para mais tarde

O desejo que tenho por ela e de fazer amor com ela.


Que nossos filhos sejam homens, e não adultos

Que eles sejam o que gostaríamos de ser, uma vez

Que nós sejamos irmãos, camaradas e cúmplices

Em vez de sermos duas gerações que se insultam.


Que nossos pais possam finalmente se libertar

E que eles passem o tempo cuidando de suas esposas

Após toda uma vida de suor e lágrimas

E de entre as guerras que não foram de paz.


Eu declaro o estado de felicidade permanente

Sem que seja apenas palavras com a música,

Sem esperar pela vinda dos tempos messiânicos,

Sem que se vote em qualquer parlamento.


Eu digo que agora nós seremos responsáveis.

Não prestaremos contas a nada e a ninguém

E vamos transformar oportunidade em destino

Apenas a bordo e sem mestre e sem Deus e sem o diabo.


E se você quiser vir, passar a ponte.

Há espaço para todos e para cada um

Mas ainda temos algum caminho

Para ver uma nova estrela brilhar.


Eu declaro um estado de felicidade permanente

Comentários

margarida disse…
Seria 'legal' se colocasse também a versão original, para quem possa ler e para quem não saiba, ver.
Aqui, até aos anos oitenta, a primeira língua estrangeira que se aprendia era o Francês.
Depois Inglês, Alemão, Espanhol, Italiano...

Ah.. o poema está lá no meu espaço, se quiser; sirva-se.
:)

(pequena nota: juro que não entendo como não tem um montão de comentadores! O pessoal não gosta de 'comunicar'? O seu blogue é bem 'maneiro'!
:)))

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