Pular para o conteúdo principal

O choro que não comove ninguém

É de supor-se que Lula dá de barato que foi de fato o comandante, o general, o maestro da organização criminosa que saqueou a Petrobras, que roubou e deixou roubar com a intenção de se perpetuar no poder. Do contrário, teria respondido de forma direta, objetiva e convincente às acusações que lhe fizeram os procuradores da Lava Jato.

Mas não o fez. Nada respondeu. A jararaca de março último, indignada por ter sido conduzida coercitivamente para depor, deu lugar ao bebê chorão, ao “velho de 70 anos” que pediu para ser deixado em paz, ao perseguido que se compara com Tiradentes esquartejado em praça pública, ao ex-líder sindical ameaçado pelas elites cruéis.

Por que não encarou de frente às acusações? Por que não as respondeu uma por uma? Por que preferiu socorrer-se da fraude de que os procuradores teriam dito carecer de provas contra ele e de só dispor de convicção? Eles disseram dispor de provas, sim. E da convicção, a partir delas, de que Lula incorreu em crimes.

Lula não foi denunciado por ter chefiado uma organização criminosa. Foi denunciado apenas e por enquanto de ter recebido quase R$ 4 milhões do dinheiro desviado da Petrobras. Parte do dinheiro acabou empregada pela empreiteira OAS na reforma do tríplex do Guarujá, parte no armazenamento de sua mudança para São Paulo.

De resto, em uma denúncia, o Ministério Público não precisa oferecer provas do que diz. Basta que ofereça indícios de materialidade da ocorrência de crime e um circunstanciado arrazoado capaz de convencer o juiz a aceitar a denúncia. Uma vez que ela seja aceita, aí, sim, juntam-se as provas e colhem-se outras.

Na proposta de delação premiada do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, ele afirma que Lula sabia que o dinheiro gasto na reforma do tríplex seria descontado da propina devida pela empreiteira ao PT. Assim como seria descontado da propina o dinheiro gasto na reforma do sítio de Atibaia, local de repouso da família Lula da Silva.

Está para aparecer a prova definitiva de que Lula comprou o tríplex que ele jura jamais ter comprado, assim como provas cabais de que o sítio de Atibaia configura um caso clássico de ocultação de patrimônio. É improvável que Lula receba da Lava Jato um atestado de idoneidade, passaporte para sua eventual candidatura a presidente em 2018.

Ele sabe disso. E por saber, agora se ocupa não em limpar as manchas que corroem sua biografia, mas em legar às gerações futuras a falsa imagem do líder dos pobres que teve sua carreira política interrompida pelo “golpe continuado” responsável pela deposição da ex-presidente Dilma e pelo fim da era do PT no poder.

O estoque de truques de Lula esgotou-se, a julgar por seu desempenho patético, caricato no ato que encenou ontem. Embora tenha votado nele mais de uma vez, não sinto pena de Lula. Não consigo sentir. Ele deixou-se seduzir pelo exercício do poder, corrompeu-se e corrompeu. Está na iminência de pagar pelo que fez.


por Ricardo Noblat

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Voltando devagar

Dois anos depois, senti vontade de voltar a escrever. Já havia perdido um bocado do entusiasmo, me sentindo incapaz de produzir algo interessante, que valha a pena ser lido, sentimento que pouco mudou. O que mudou foi o jeito como estou começando a ver as coisas. Outro dia, li algo que me chamou a atenção, tipo: "A arte não é para o artista mais do que a água é para o encanador”. E continuava, "Não, a arte é para quem a absorve, mesmo que o artista nem sempre tenha plena consciência do quanto isso é verdade. Pois sim, na verdade, a maioria dos artistas que ainda decidimos considerar entre “os grandes” estavam fazendo isso para fins em grande parte masturbatórios, em oposição à pura motivação de “querer criar algo para os outros." Aparentemente, trata-se de uma fala de um personagem de filme. Ainda estou por checar. Definitivamente, o que faço aqui não é arte, não tenho essa pretensão, no entanto, essa é sem dúvida uma questão estranha sobre a arte como um conceito, que a...

Perda irreparável

Na terça-feira passada, 17, fui surpreendido com uma das piores notícias da minha vida - um dos amigos que mais gosto, um por quem tenho enorme admiração, um irmão que a vida me deu, havia deixado este mundo. A notícia não dava margem a dúvidas. Era um cartão, um convite para o velório e cremação no dia seguinte. Não tinha opção, a não ser tentar digerir aquela trágica informação. Confesso que nunca imaginei que esta cena pudesse acontecer. Nunca me vi  nesta situação, ainda mais em se tratando do Sylvio. A chei que  ele estaria aqui pra sempre. Que todos partiriam, inclusive eu, e ele aqui ficaria até  quando ele próprio resolvesse que chegar a hora de descansar. Ele era assim,  não convencional e suspeitei que, como sempre fez, resolveria também  essa questão. Hoje em dia, com a divisão ideológica vigente e as mudanças nos códigos  de conduta, poucos diriam dele: que cara maneiro! M esmo os que se surpreendiam ou não gostavam de algumas de suas facetas, c...

História do Filho da Puta

John Frederick Herring (1795 - 1865) foi um conhecido pintor de cenas esportivas e equinas, na Inglaterra. Em 1836, o autor do famoso quadro "Pharaoh's Charriot Horses", avaliado em mais de $500.000, acrescentou "SR" (Senior) à assinatura que apunha em seus quadros por causa da crescente fama de seu filho, então adolescente, que se notabilizou nessa mesma área. Apesar de nunca ter alcançado um valor tão elevado, um outro de seus quadros tem uma história bastante pitoresca. Em 1815, com apenas 20 anos, Herring, o pai, como era tradição, imortalizou em um quadro a óleo o cavalo ganhador do St Leger Stakes, em Doncaster, na Inglaterra. Até aí, nada de mais. A grande surpresa é o nome do animal: Filho da Puta! É isso mesmo. Filho da puta. Há pelo menos três versões sobre a origem desse estranho nome. A que parece mais plausível (e também a mais curiosa), dá conta que o embaixador português na Inglaterra, à época, era apaixonado por turfe e também por uma viúva com q...