Por Marco Antonio Villa
Em 1928, no México, foi assassinado o presidente eleito Álvaro Obregón. O assassinato gerou grave turbulência política. Obregón já tinha exercido a Presidência nos anos 1920-1924. A Constituição de 1917 proibia a reeleição mas não o retorno ao poder após um interregno. O presidente em exercício, Plutarco Elias Calles, administrou a crise, elegeu outro sucessor e se transformou no dirigente de fato nos anos 1928-1935. Esse período da história mexicana ficou conhecido como "maximato", ou seja, Calles, considerado o "chefe máximo da revolução", era o dirigente de fato do governo. Este domínio terminou quando Lázaro Cárdenas, seu afilhado político, eleito presidente em 1934, no ano seguinte rompeu com seu mentor.
A crise do governo Dilma Rousseff e o retorno de Lula ao primeiro plano da cena política nacional é o nosso maximato. Lula teve de assumir o posto de presidente de fato, pois a presidente perdeu o controle da situação. Era esperado que isto fosse acontecer mas não tão cedo, com menos de cinco meses de governo. A inexperiência política da presidente era sabidamente conhecida. Antes de 2003, nunca tinha exercido qualquer cargo de importância nacional. Desconhecia os meandros de Brasília, além de não saber negociar, conviver com a diferença e com opiniões contrárias. Foi formada em outro mundo e outra época. Para ela, ainda deve valer o centralismo democrático, a forma stalinista de administrar, que trata qualquer opinião contrária como crime ou traição.
Quando foi ministra das Minas e Energia, ou mesmo na Casa Civil, pouco fez política. Outros ministros exerceram esse papel ou o próprio presidente Lula foi o articulador do governo. Sabedor desta dificuldade, Lula escolheu a dedo o chefe da Casa Civil. Antonio Palocci seria uma espécie de primeiro-ministro e encarregado dos contatos políticos com o Congresso Nacional e com os representantes do grande capital. Contudo, Palocci se encastelou no governo e pouco apareceu. De início foi considerado que era uma atitude de esperteza política, que estava articulando nas sombras. É a velha prática brasileira de encontrar qualidade onde há nulidade. O silêncio de Palocci foi entendido como estratégia e não como a mais perfeita tradução de alguém que não tem a mínima capacidade para o exercício do cargo. E para piorar surgiram as denúncias das consultorias pagas a peso de ouro.
A confusão ficou maior quando a articulação no Congresso Nacional demonstrou sua fragilidade. O pesado líder do governo deixou de realizar o papel de elo entre a base e o Planalto. Ficou cuidando dos seus interesses partidários. O ministro da Articulação Política é absolutamente inexpressivo (a maioria dos parlamentares sequer sabe o seu nome). Dada a sua fragilidade, estranho é que tenha demorado tanto tempo para que ruísse o esquema político organizado por Lula no final do ano passado.
O mais curioso é que a crise nasceu no interior do próprio governo. Ou seja, não foi provocada em nenhum instante pela ação oposicionista. A oposição continua desarticulada, politicamente dividida e omissa. A divisão ficou mais uma vez demonstrada na convenção do PSDB. O governo até recebeu um alento, pois a reeleição de Sérgio Guerra à presidência do partido indica que a oposição peessedebista continuará tímida, quase envergonhada, sem representar perigo. O Brasil desafia a teoria política: para o governo, o problema não é a oposição mas o próprio governo.
Como contentar o PMDB? Cedendo espaço na máquina governamental que possibilite bons negócios. Rentáveis para efeito privado e péssimos para o interesse público. O governo postergou, até o momento, a partilha do butim, não pela defesa da moralidade pública. Longe disso. Está testando o partido para ver até que ponto é possível negociar. Outra dificuldade é o relacionamento com o grande capital. Aí é briga para gente grande. Não é meramente para controlar alguma licitação de compra de remédios ou de alguma estrada. Representa desenhar o futuro econômico do país, estabelecer o relacionamento dos fundos de pensão com as grandes empresas e bancos, apontar para onde deve seguir o processo de acumulação capitalista. É uma disputa dentro do PT. O antigo partido socialista hoje é o partido das grandes corporações. Daí o número de consultores petistas. De uma hora para outra, todos viraram especialistas em capitalismo.
O mais estranho é que o país segue seu ritmo normal. Como se voasse com piloto automático. Até certo ponto, a economia vai bem. Segue no vácuo do que já foi feito. Isto tem um limite. Já está no momento de traçar novo rumo. Mas como iniciar esta discussão se o governo mal consegue administrar suas contradições?
Dilma vai precisar demonstrar que comanda. Pura encenação. Coisa de ópera bufa. Nos próximos dias assistiremos à presidente em várias reuniões. Veremos também (ah, a importância das imagens...) ela, séria, numa reunião ministerial; sorrindo, quando encontrar a liderança do PMDB. Mas a crise vai continuar. Palavras não substituem as ações.
E Lula? Depois que reassumiu informalmente o governo, vai permanecer como o poder atrás do trono. Não vai se imiscuir nas questões do varejo político. Vai atuar no atacado, valorizando (como gostaria de dizer nas suas célebres metáforas futebolísticas) o seu passe. E preparando calmamente o seu retorno ao Palácio do Planalto. Já deve ter jornal preparando a edição especial do dia 1º de janeiro de 2015. A manchete? Também já está pronta. Em letras garrafais, no alto página, estará escrito: "Ele voltou."
Em 1928, no México, foi assassinado o presidente eleito Álvaro Obregón. O assassinato gerou grave turbulência política. Obregón já tinha exercido a Presidência nos anos 1920-1924. A Constituição de 1917 proibia a reeleição mas não o retorno ao poder após um interregno. O presidente em exercício, Plutarco Elias Calles, administrou a crise, elegeu outro sucessor e se transformou no dirigente de fato nos anos 1928-1935. Esse período da história mexicana ficou conhecido como "maximato", ou seja, Calles, considerado o "chefe máximo da revolução", era o dirigente de fato do governo. Este domínio terminou quando Lázaro Cárdenas, seu afilhado político, eleito presidente em 1934, no ano seguinte rompeu com seu mentor.
A crise do governo Dilma Rousseff e o retorno de Lula ao primeiro plano da cena política nacional é o nosso maximato. Lula teve de assumir o posto de presidente de fato, pois a presidente perdeu o controle da situação. Era esperado que isto fosse acontecer mas não tão cedo, com menos de cinco meses de governo. A inexperiência política da presidente era sabidamente conhecida. Antes de 2003, nunca tinha exercido qualquer cargo de importância nacional. Desconhecia os meandros de Brasília, além de não saber negociar, conviver com a diferença e com opiniões contrárias. Foi formada em outro mundo e outra época. Para ela, ainda deve valer o centralismo democrático, a forma stalinista de administrar, que trata qualquer opinião contrária como crime ou traição.
Quando foi ministra das Minas e Energia, ou mesmo na Casa Civil, pouco fez política. Outros ministros exerceram esse papel ou o próprio presidente Lula foi o articulador do governo. Sabedor desta dificuldade, Lula escolheu a dedo o chefe da Casa Civil. Antonio Palocci seria uma espécie de primeiro-ministro e encarregado dos contatos políticos com o Congresso Nacional e com os representantes do grande capital. Contudo, Palocci se encastelou no governo e pouco apareceu. De início foi considerado que era uma atitude de esperteza política, que estava articulando nas sombras. É a velha prática brasileira de encontrar qualidade onde há nulidade. O silêncio de Palocci foi entendido como estratégia e não como a mais perfeita tradução de alguém que não tem a mínima capacidade para o exercício do cargo. E para piorar surgiram as denúncias das consultorias pagas a peso de ouro.
A confusão ficou maior quando a articulação no Congresso Nacional demonstrou sua fragilidade. O pesado líder do governo deixou de realizar o papel de elo entre a base e o Planalto. Ficou cuidando dos seus interesses partidários. O ministro da Articulação Política é absolutamente inexpressivo (a maioria dos parlamentares sequer sabe o seu nome). Dada a sua fragilidade, estranho é que tenha demorado tanto tempo para que ruísse o esquema político organizado por Lula no final do ano passado.
O mais curioso é que a crise nasceu no interior do próprio governo. Ou seja, não foi provocada em nenhum instante pela ação oposicionista. A oposição continua desarticulada, politicamente dividida e omissa. A divisão ficou mais uma vez demonstrada na convenção do PSDB. O governo até recebeu um alento, pois a reeleição de Sérgio Guerra à presidência do partido indica que a oposição peessedebista continuará tímida, quase envergonhada, sem representar perigo. O Brasil desafia a teoria política: para o governo, o problema não é a oposição mas o próprio governo.
Como contentar o PMDB? Cedendo espaço na máquina governamental que possibilite bons negócios. Rentáveis para efeito privado e péssimos para o interesse público. O governo postergou, até o momento, a partilha do butim, não pela defesa da moralidade pública. Longe disso. Está testando o partido para ver até que ponto é possível negociar. Outra dificuldade é o relacionamento com o grande capital. Aí é briga para gente grande. Não é meramente para controlar alguma licitação de compra de remédios ou de alguma estrada. Representa desenhar o futuro econômico do país, estabelecer o relacionamento dos fundos de pensão com as grandes empresas e bancos, apontar para onde deve seguir o processo de acumulação capitalista. É uma disputa dentro do PT. O antigo partido socialista hoje é o partido das grandes corporações. Daí o número de consultores petistas. De uma hora para outra, todos viraram especialistas em capitalismo.
O mais estranho é que o país segue seu ritmo normal. Como se voasse com piloto automático. Até certo ponto, a economia vai bem. Segue no vácuo do que já foi feito. Isto tem um limite. Já está no momento de traçar novo rumo. Mas como iniciar esta discussão se o governo mal consegue administrar suas contradições?
Dilma vai precisar demonstrar que comanda. Pura encenação. Coisa de ópera bufa. Nos próximos dias assistiremos à presidente em várias reuniões. Veremos também (ah, a importância das imagens...) ela, séria, numa reunião ministerial; sorrindo, quando encontrar a liderança do PMDB. Mas a crise vai continuar. Palavras não substituem as ações.
E Lula? Depois que reassumiu informalmente o governo, vai permanecer como o poder atrás do trono. Não vai se imiscuir nas questões do varejo político. Vai atuar no atacado, valorizando (como gostaria de dizer nas suas célebres metáforas futebolísticas) o seu passe. E preparando calmamente o seu retorno ao Palácio do Planalto. Já deve ter jornal preparando a edição especial do dia 1º de janeiro de 2015. A manchete? Também já está pronta. Em letras garrafais, no alto página, estará escrito: "Ele voltou."
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