Pular para o conteúdo principal

As funções do julgamento do mensalão



O ex-ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, é do tempo em que advogados famosos, como sempre pagos a peso de ouro, engendravam teses mirabolantes, realizavam manobras surpreendentes e seus discursos encantavam às Cortes, livrando seus clientes de um ajustes de contas efetivo por eventuais mal-feitos perpetrados. Os julgamentos eram dominados pela figura do advogado como, por exemplo, no caso Ângela Diniz, morta pelo empresário Raul "Doca" Street, cuja tese, elaborada por Evandro Lins e Silva, de "legítima defesa da honra e ter matado por amor" obteve uma pena de somente 2 anos de cadeia e o direito de cumpri-la em liberdade.

Naquela época, muitas vezes, a argumentação técnica, com recheio em geral retirado das brechas da Lei, acabava tendo mais valor do que as provas, e, principalmente, dos indícios que poderiam conduzir a um juízo sobre as circunstâncias nas quais se deu um fato.

Contra estes anacronismos, e demonstrando que é possível, com as exceções de sempre, haver independência em relação a quem os nomeou, o STF vem prestando um grande serviço de utilidade pública, destruindo os débeis pedidos de falta de justa causa (porque mentirosos), como os de Thomaz Bastos, e deitando por terra a tradicional leniência com a corrupção, que ainda graça pelo país afora.

Hoje, a exemplo do que acontece em lugares mais civilizados, como os EUA e a Europa, a mão pesada da Lei parece tomar corpo e a jurisprudência que sairá do julgamento do mensalão petista, no que se refere a esse tipo de crime, pode vir a inibir a ação de corruptores e corruptos, no âmbito da política, uma vez que não contarão mais com a certeza da impunidade, ou de abrandamento de penalização esperado.

Embora ainda possam advir surpresas desagradáveis, o julgamento ora em curso, por sua grande visibilidade e repercussão, está exercendo não apenas a função de apontar os culpados e dosar-lhes a pena, mas, constitui ato civilizatório e um divisor de águas, que será lembrado por longos anos, não só nos corredores da Justiça, como pela população em geral. E como ainda não terminou, que os culpados, e há muitos, sejam exemplarmente punidos. É o que se espera.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Voltando devagar

Dois anos depois, senti vontade de voltar a escrever. Já havia perdido um bocado do entusiasmo, me sentindo incapaz de produzir algo interessante, que valha a pena ser lido, sentimento que pouco mudou. O que mudou foi o jeito como estou começando a ver as coisas. Outro dia, li algo que me chamou a atenção, tipo: "A arte não é para o artista mais do que a água é para o encanador”. E continuava, "Não, a arte é para quem a absorve, mesmo que o artista nem sempre tenha plena consciência do quanto isso é verdade. Pois sim, na verdade, a maioria dos artistas que ainda decidimos considerar entre “os grandes” estavam fazendo isso para fins em grande parte masturbatórios, em oposição à pura motivação de “querer criar algo para os outros." Aparentemente, trata-se de uma fala de um personagem de filme. Ainda estou por checar. Definitivamente, o que faço aqui não é arte, não tenho essa pretensão, no entanto, essa é sem dúvida uma questão estranha sobre a arte como um conceito, que a...

Perda irreparável

Na terça-feira passada, 17, fui surpreendido com uma das piores notícias da minha vida - um dos amigos que mais gosto, um por quem tenho enorme admiração, um irmão que a vida me deu, havia deixado este mundo. A notícia não dava margem a dúvidas. Era um cartão, um convite para o velório e cremação no dia seguinte. Não tinha opção, a não ser tentar digerir aquela trágica informação. Confesso que nunca imaginei que esta cena pudesse acontecer. Nunca me vi  nesta situação, ainda mais em se tratando do Sylvio. A chei que  ele estaria aqui pra sempre. Que todos partiriam, inclusive eu, e ele aqui ficaria até  quando ele próprio resolvesse que chegar a hora de descansar. Ele era assim,  não convencional e suspeitei que, como sempre fez, resolveria também  essa questão. Hoje em dia, com a divisão ideológica vigente e as mudanças nos códigos  de conduta, poucos diriam dele: que cara maneiro! M esmo os que se surpreendiam ou não gostavam de algumas de suas facetas, c...

História do Filho da Puta

John Frederick Herring (1795 - 1865) foi um conhecido pintor de cenas esportivas e equinas, na Inglaterra. Em 1836, o autor do famoso quadro "Pharaoh's Charriot Horses", avaliado em mais de $500.000, acrescentou "SR" (Senior) à assinatura que apunha em seus quadros por causa da crescente fama de seu filho, então adolescente, que se notabilizou nessa mesma área. Apesar de nunca ter alcançado um valor tão elevado, um outro de seus quadros tem uma história bastante pitoresca. Em 1815, com apenas 20 anos, Herring, o pai, como era tradição, imortalizou em um quadro a óleo o cavalo ganhador do St Leger Stakes, em Doncaster, na Inglaterra. Até aí, nada de mais. A grande surpresa é o nome do animal: Filho da Puta! É isso mesmo. Filho da puta. Há pelo menos três versões sobre a origem desse estranho nome. A que parece mais plausível (e também a mais curiosa), dá conta que o embaixador português na Inglaterra, à época, era apaixonado por turfe e também por uma viúva com q...