Pular para o conteúdo principal

O burro falante e o marco civil da internet

Conselheiro ou Burro Falante é um personagem de livros do Sítio do Picapau Amarelo, que surgiu no primeiro livro da série e foi ganhando protagonismo desde que Emília o apelidou Conselheiro, por achá-lo ótimo para dar conselhos. Até aí, tudo bem, tudo muito interessante, no entanto, na vida real, confiar em burros falantes ou em certos "conselheiros" é que é o problema.

Outro "conselheiro", não menos falante, vem a público atacar a (sábia) decisão do desembargador Xavier de Souza, da justiça paulista, que cassou a estapafúrdia medida da juíza Sandra Marques, cujo decreto pretendia o bloqueio do WhatsApp por 48 horas em todo o país.

Alegando que empresas como o WhatsApp ou Facebook, atuando em território nacional,  estariam obrigadas a respeitar a legislação brasileira, o burro falante, quer dizer, o conselheiro, ataca em dois flancos: cita dívida do Facebook de 12 milhões em multas e, comparando as empresas a restaurantes, fornecedores de energia elétrica e universidades, afirma que eventual descumprimento de normas por parte de tais organizações permitiria o seu fechamento, temporário ou total. No caso, segundo ele, a infração foi ao famigerado e controverso Marco Civil da Internet.

Ora, vamos lá, o que usa na argumentação esse burro falante, quer dizer, conselheiro? Uma rápida busca na internet mostra que inúmeras instituições, concessões, empresas e organizações em geral são multadas, diariamente, por conta de conduta indevida, seja no cumprimento de sua atividade fim ou por não atender a uma determinação judicial. Isso é absolutamente normal. Em geral, a multa é sucedida por uma contestação onde se busca a adequação da penalidade em caso de infração provada, ou extinção da mesma se restar constatada a inocência ou inadequação da multa. Não sei em que pé se encontra o julgamento das multas impostas ao Facebook, mas, se ainda não foram pagas - é sabido que muitos de tais processos se arrastam por anos - é porque ainda não se esgotaram os inúmeros atos disponíveis aos advogados para cumprir o papel de defender os seus clientes. Isso também é inteiramente normal. Portanto, se consta inscrita uma dívida de R$ 12 milhões em nome do Facebook, e isso ainda não aconteceu, é preciso ser muito canalha para ignorar que o processo encontra-se em fase de julgamento ou recurso. Aliás, esta "dívida" ainda não existe, e a multa foi originada por outra recusa do WhatsApp de fornecer à justiça mensagens de suspeitos de tráfico internacional, podendo se esfumaçar se a decisão for favorável à empresa de Mark Zukerberg.

O burro falante, quer dizer, conselheiro, lembra também que qualquer empresa pode ser suspensa ou fechada por infringir a lei, e cita o marco civil como a base para a decisão inominável da juíza de São Bernardo do Campo - o WhatsApp teria ignorado pedido de informações em investigação criminal. Ao apontar que o bloqueio foi feito com base no Marco Civil, revela aquilo que já sabíamos: que este foi escrito para dar margem a interpretações indevidas e idiotas como essa, para permitir a intimidação e a censura. No texto aprovado do MCI está claro que o usuário está imune e tem o direito de consumir o que é melhor para si, utilizando o serviço de internet como bem entender.  Isso, aparentemente, nos daria a tranquilidade de que não seremos censurados ou impedidos de usar um recurso de internet que julgarmos de nosso agrado. No entanto, como permeia a nossa legislação, também ali foram deixadas as brechas que dão margem a esses absurdos, por exemplo, a alegação de que estariam fazendo coleta e tratamento irregular de dados pessoais, e assim, como confessa o burro falante, quer dizer, conselheiro, o decreto judicial ocorreu com base, sim, no infausto marco civil.

O que deseja, na verdade, o burro falante, quer dizer, conselheiro? Que o lixo do tal "marco civil da internet" se sobreponha à Constituição e que a liberdade de expressão, a livre iniciativa e milhões de usuários fiquem à mercê de juízes inconsequentes que vêem na censura e pressão econômica formas de obrigar que suas decisões, por mais idiotas e prejudiciais, sejam obedecidas sem se preocupar que atinjam milhões de consumidores e usuários apenas porque detém nas mãos uma caneta e uma legislação burra e autoritária, feita de encomenda para os poderosos de ocasião intimidarem adversários e concorrentes.

Felizmente, em poucas horas, a estupidez deu lugar à razão, e uma idéia extravagante, uma arbitrariedade, um capricho não prevaleceu. Mas, fica a pergunta: outras ações não virão? Outros togados não vão achar que uma lei absurda, idiota, pode ser usada em casos parecidos? Empresários, blogueiros, jornalistas, profissionais liberais e o público em geral não terão, sempre, a impressão que existe um cutelo, que depende de muito pouco para lhes cair sobre os pescoços se desagradarem ou não concordarem com os poderosos de ocasião? A conferir.

Salta aos olhos que o aparelhamento da máquina pública, em todas as suas esferas, é completo. A esquerda e suas vertentes autoritárias, estão em todo lugar, como um câncer. É por causa disso que precisamos tanto da educação de qualidade, isenta de ideologias e de doutrinadores (os não professores), voltada para promover a cidadania, o crescimento pessoal e comunitário, a formação de homens e mulheres que possuam discernimento e capacidade, para deixarem, cada vez mais, os burros falantes falando sozinhos.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Com corona ou sem corona, dia 15, eu vou!

Em tempos de corona virus, pode parecer estranho, mas, fica mais importante ainda comparecer à manifestação do próximo dia 15. Contra as tentativas sórdidas de congressistas de alto coturno, jornalistas militantes e parte do judiciário, de usurpar poderes, prejudicar ações, e evitar que governe conforme o mandato que lhe concederam, é preciso demonstrar de forma cristalina que o presidente está, cada vez mais, com apoio popular, e que o desejo de que prossiga com as reformas do Estado, o combate à corrupção e à esquerda tacanha, gananciosa e cretina continua firme e forte. O sistema de governo é presidencialista, e isso já foi decidido há mais de 25 anos, quando se jogou uma montanha de dinheiro fora pra oficializar o que todo mundo sabia. É, portanto, intolerável que um presidente eleito, ainda que pairem dúvidas sobre a lisura do pleito, não consiga dar um passo sem que membros vetustos e caquéticos do STF não só opinem como trabalhem contra ele. Que a imprensa a tudo critiqu...

História do Filho da Puta

John Frederick Herring (1795 - 1865) foi um conhecido pintor de cenas esportivas e equinas, na Inglaterra. Em 1836, o autor do famoso quadro "Pharaoh's Charriot Horses", avaliado em mais de $500.000, acrescentou "SR" (Senior) à assinatura que apunha em seus quadros por causa da crescente fama de seu filho, então adolescente, que se notabilizou nessa mesma área. Apesar de nunca ter alcançado um valor tão elevado, um outro de seus quadros tem uma história bastante pitoresca. Em 1815, com apenas 20 anos, Herring, o pai, como era tradição, imortalizou em um quadro a óleo o cavalo ganhador do St Leger Stakes, em Doncaster, na Inglaterra. Até aí, nada de mais. A grande surpresa é o nome do animal: Filho da Puta! É isso mesmo. Filho da puta. Há pelo menos três versões sobre a origem desse estranho nome. A que parece mais plausível (e também a mais curiosa), dá conta que o embaixador português na Inglaterra, à época, era apaixonado por turfe e também por uma viúva com q...

Ibsen - inimigo nº 1 do Rio

Separados no nascimento O deputado Ibsen Pinheiro acaba de se tornar o inimigo público número 1 do Rio de Janeiro. Além de aprovar um projeto estapafúrdio, repleto de inconstitucionalidades, apareceu no Jornal Nacional declarando que os cariocas não sabem o que fazem. De uma só tacada desqualificou o protesto contra a emenda que ontem reuniu, segundo a PM, mais de 150 mil pessoas no centro do Rio, comparando-o à passeata dos cem mil, e ainda desancou os cariocas, prevendo que ficaremos sem nada. Em primeiro lugar, Ibsen comete uma imbecilidade histórica: a Passeata dos Cem Mil não foi de apoio à revolução de 64, como sugeriu, e sim, contra o governo militar, tendo sido organizada em 68, pelo movimento estudantil, com apoio de artistas, intelectuais (eu detesto essa classificação. Afinal, você conhece alguém que se identifica como intelectual? "Prazer, sou um intelectual". Que imbecilidade!) e setores da sociedade. O gaúcho idiota, que já teve o mandato injustamente cassado e...